DÉCIMA OITAVA PARTE: A RAIVA
Se herda? Se adquire? Se cultiva? Se perde? Se transforma? Se contagia? Por quais canais se transmite? Como se torna coletiva? É criativa?
Em que momento se torna digna? Quando começa a se distanciar do rancor e da vingança? Se aproxima da justiça?
Como se converte em raiz histórica de povos inteiros, diferentes em geografia, língua, cultura, história, tempo?
A raiva é a ponte entre a dor e a rebeldia?
Em que momento a angústia, o desespero, a impotência se transformam em raiva?
E se os desaparecidos, as desaparecidas, herdam, ao contrário, a raiva para aqueles que os procuram? E se parem as suas progenitoras?
E se as buscadoras não procuram consolo, piedade, simpatia, a esmola da atenção alheia? E se também buscam nossa raiva?
E se todas as raivas têm uma mesma raiz e elas, nós – os povos – nos encontramos nessa raiz?
Nos saudaremos? Teremos forças para nos sorrir, abraçar, trocar não só dores, mas também os dados do responsável – seu mesmo rosto (embora diferente), seu riso sarcástico, seu olhar de zombaria, seu cinismo, sua maneira de saber-se impune, a bandeira do dinheiro?
E se alguma vez, no inconcluso livro da história, alguém observa uma luz, qualquer, que, sem alardes nem slogans, indique ‘esta luz foi parida pela raiva’?
E se o que nos une, apesar de todas as diferenças, é a mesma raiva? Quem nos enfrentará? Quem nos condenará à mesma derrota de outrora, de agora, de hoje mesmo? Quem nos ameaçará com um amanhã igual ao ontem?
Quem perderá e quem encontrará?
-*-
Jovens zapatistas ensaiando uma peça de teatro para a celebração dos 30 anos do início da guerra contra o esquecimento. Imagens cortesia de Los Tercios Compas, copyleft dezembro de 2023. Música de Keny Arkana: ‘La Rage’.»
El Capitán.
México, dezembro de 2023.
40, 30, 20, 10, 1 ano depois.
No hay comentarios todavía.
RSS para comentarios de este artículo.